Já ouviu falar de uma doença que faz com que as pessoas se canibalizem? Ela existe, infelizmente. A síndrome de Lesch-Nyhan (SLN) é uma condição muito rara causada por um único gene defeituoso no cromossomo X.
Tal como acontece com a hemofilia, mulheres,que têm dois cromossomos X, geralmente são portadoras assintomáticas do gene. Apenas um único caso feminino já foi relatado. Homens sentem os efeitos da doença.
O gene HPRT1 (Xq26) mutado leva a uma deficiência da enzima hipoxantina guanina fosforiboxiltransferase (HGPRT), essencial para o sistema de reciclagem de células vivas.
As células quebram DNA dentro delas por suas partes componentes. Estas peças, por sua vez, também precisam ser quebradas. Duas dessas peças, adenina e guanina, são responsabilidade de HGPRT.
Na ausência de uma enzima que pode quebrá-los corretamente, os compostos se acumulam até que se decompõem em ácido úrico. Ácido úrico irrita a célula e passa para o sangue, causando cristais na urina, também conhecidos como pedras nos rins. Este é um sintoma que ajuda os médicos a diagnosticar uma pessoa com síndrome de Lesch-Nyhan.
Um sintoma ainda mais horrível é um tipo específico de autolesão. Pessoas com a síndrome tendem a morder os lábios, a língua e a mastigar seus dedos. Às vezes, as lesões são apenas desagradáveis e formam cicatrizes, porém, em alguns casos, os pacientes podem realmente mastigar suas línguas e dedos.
O comportamento é tão comum que é considerado característico da síndrome, e deu-lhe o apelido de “síndrome da auto-canibalização”. Além da automutilação e das pedras nos rins, retardo mental, comportamento agressivo e artrite gotosa são outros sintomas possíveis da condição.
Os médicos não sabem direito por que essa mutilação ocorre. A explicação mais simples é que o ácido úrico irrita as células, e as pessoas mordem seus tecidos mais sensíveis da mesma maneira que coçam uma picada de mosquito até sangrar.
Outra teoria é que os efeitos do ácido úrico no cérebro em desenvolvimento provoca uma falta de dopamina. Assim, a síndrome de Lesch-Nyhan seria como o “oposto” da doença de Parkinson: enquanto as pessoas com Parkinson não conseguem iniciar as ações que estão pensando em fazer, as pessoas com Lesch-Nyhan não podem se impedir de fazer as coisas que pensam. Se elas pensam em morder a si mesmas, fazem isso, mesmo que não queiram.
Ainda outra teoria diz que quaisquer lesões causam uma grande liberação de dopamina no cérebro de alguém com a síndrome. Em seguida, uma lesão acidental no rosto ou nas mãos traz boas sensações, que fazem com que as pessoas se machuquem mais de propósito.
Provavelmente há um componente psicológico para esse comportamento. Um tratamento possível para os pacientes com a síndrome que se mordem compulsivamente é a remoção completa dos dentes. Infelizmente, isso não impede que eles se arranhem.
A síndrome de Lesch-Nyhan é genética, e as mulheres com histórico da doença na família podem fazer exames para saber se são portadoras da mutação antes de engravidar. A condição afeta aproximadamente um em cada 380.000 nascidos vivos. Não existe nenhuma cura para a doença, apenas controle dos sintomas.
Mas afinal, por quanto tempo uma pessoa consegue sobreviver assim?
Muitos de nós já ouviram histórias de pessoas que sobreviveram a desastres e tiveram de recorrer a atitudes extremas, como canibalismo, para não morrer de fome enquanto aguardavam resgate. O internauta Rob Faraone imaginou uma situação um pouco diferente: se uma pessoa tivesse de comer partes de seu corpo, por quanto tempo sobreviveria?
A convite do site The Naked Scientists, o estudante de medicina Louise Anthony deu uma resposta a Faraone, e como você lerá a seguir, as coisas são mais complicadas do que parecem.
“Primeiramente”, escreve Anthony, “assumimos que a cirurgia e as possíveis infecções não matariam a pessoa, e vamos ignorar a enorme quantidade de energia necessária para se recuperar desse tipo de ferimento”. Também seria preciso supor que a pessoa poderia preservar os órgãos para consumo e que teria uma maneira bastante criativa de se alimentar, já que eventualmente comeria os próprios braços.
Quanta “carne” estaria disponível para o consumo? De acordo com cálculos feitos pela NASA e tomando como base um adulto com 82,5 kg, braços e pernas correspondem a 40% da massa corporal – cerca de 32 kg, no caso.
Como pouco se sabe sobre o valor nutricional da carne humana, é preciso pegar outro parâmetro para calcular a quantidade de energia disponível nesses 32 kg. “Nesse caso, nós usamos bife de porco cru, que (…) oferece 213 kilocalorias a cada 100 gramas. Isso significa que nossos 32 kg de partes poderiam oferecer impressionantes 68 mil kcal”.
Usando estimativas feitas pela Organização Mundial da Saúde e considerando que uma pessoa sem braços e pernas teria um gasto energético menor – cerca de 1.750 kcal/dia –, Anthony estimou que a pessoa poderia sobreviver por 39 dias. Como a remoção dos dois braços exigiria a ajuda de alguém, o mais provável é que a pessoa servisse de alimento para o outro, e não para si mesma, mas aí já é outra história.
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