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Como Funciona o Tráfico Humano

O tráfico humano, especialmente o de mulheres, é uma das atividades criminosas que cresce mais rapidamente no mundo. Segundo o mais recente estudo da Global Financial Integrity, entidade especializada no assunto, as organizações por trás desse tipo de crime movimentam anualmente cerca de US$ 32 bilhões graças à captação de mão de obra em países pobres ou em desenvolvimento e à venda forçada de seus serviços em regiões onde o poder aquisitivo é mais alto.




Vítima é enganada sobre motivo real de sua viagem

É preciso diferenciar o tráfico humano do contrabando de imigrantes. Esse último é a entrada ilegal de pessoas em outro país. Embora também possua como fundamento a miséria no local de origem e conte com auxílio de intermediários que visam apenas ganhar dinheiro na transação, ela tem a aceitação da pessoa a ser contrabandeada, mesmo que isso envolva o transporte em condições degradantes. O imigrante acata essas condições a fim de atingir o objetivo conhecido de buscar uma vida melhor em outra localidade.

Já o tráfico humano parte do desconhecimento da pessoa sobre o objetivo real de sua viagem. Ela pode ser levada sob ameaça de força, ser raptada, coagida ou enganada, fato que acontece na maioria dos casos. É levada a crer que terá uma oportunidade de trabalho com remuneração capaz de atender às suas necessidades e também será suficiente para auxiliar sua família no local de origem. Isso, no entanto, não passa de técnica de recrutamento. Ao chegar, será explorada para o benefício da pessoa que a controla.

O processo funciona desta maneira:

1) Aliciador mapeia países e regiões pobres

O aliciador é a parte mais ativa da cadeia do tráfico humano. Ele sai em busca de mulheres nas regiões pobres, com desemprego alto e baixo nível de escolaridade. Países da Ásia, África e América Latina estão entre os alvos preferidos desses captadores de mulheres, que são levadas para Europa, Japão e Estados Unidos, em sua grande maioria. O Brasil entra duplamente nessa listagem de países. Não apenas é um grande fornecedor de mão de obra como também é um ponto de passagem de mulheres vindas de outras localidades.

2) Mulheres na faixa de 18 a 20 anos são alvo preferido

Depois de mapeadas as regiões, os aliciadores começam a fazer os contatos com as mulheres. No Brasil, os principais pontos de captação são as regiões Nordeste e Centro-Oeste. Buscam sempre jovens na faixa de 18 a 20 anos, sem emprego, de preferência que sejam mães solteiras e tenham família numerosa.

Isso as deixa mais vulneráveis e desesperadas para conseguir uma ocupação que forneça uma remuneração capaz de ajudá-las não apenas a se sustentar, mas cobrir as despesas dos filhos e agregados. Geralmente oferecem uma posição como dançarina, hostess de casa noturna ou cuidadora de idosos. Dizem que bancarão as despesas de viagem e elas, assim que receberem os primeiros salários, pagarão os gastos iniciais.

3) Documentação e maquiagem

Proposta de trabalho aceita, o aliciador passa para a terceira fase do trabalho que é preparar o "envio da mercadoria". Ele precisa providenciar a documentação da contratada e deixá-la em condições de passar pela alfândega sem que gere suspeitas, especialmente no país de entrada. Afinal, o objetivo é de que a pessoa entre como turista e fique trabalhando de forma ilegal. Dessa maneira, a mulher fica impedida de recorrer às autoridades locais, uma vez que está fora das normas vigentes, se tornando uma clandestina no país.

Os aliciadores muitas vezes usam de propinas para ter o auxílio das autoridades locais na emissão de documentos e mesmo na facilitação do trânsito das mulheres. Mas também desenvolvem métodos de fugir das fiscalizações. O Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (Cecria) realizou no começo do século a Pesquisa Nacional sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes (Pestraf) no Brasil tendo o auxílio de várias entidades não governamentais e listou 110 rotas internas e 131 internacionais de tráfico humano.

4) Primeiro estágio é completado no aeroporto

Como no caso das mulheres brasileiras é a Europa, especialmente a Espanha, a principal porta de entrada das vítimas de tráfico, o aliciador costuma, na maioria das vezes, completar seu trabalho no aeroporto. Ele deixa sua selecionada desacompanhada para não gerar suspeitas. De lá, ela toma o rumo ao destino final, onde outra pessoa estará esperando para recepcioná-la depois que os fiscais da Alfândega autorizarem a entrada.

De acordo com Hugo Thiago Almeida publicado pela Universidade Federal de Santa Catarina, 59% dos aliciadores são homens, entre 20 e 56 anos, e têm em sua maioria origem europeia. Eles recebem por cada escrava sexual captada. Uma asiática para o mercado dos Estados Unidos, por exemplo, pode render US$ 16 mil. Estima-se que a captação de cada vítima custe US$ 30 mil entre documentação, transporte, hospedagens e outros custos necessários.

5) Tomada de documentos é a primeira medida

O conto de fadas de um emprego e o sonho da melhoria de qualidade de vida toma um choque de realidade logo na recepção. A primeira medida da pessoa que acolhe a vítima de tráfico no ponto de chegada é recolher sua documentação. Sem o passaporte, a mulher não tem liberdade sequer para comprar uma passagem de volta (mesmo que tivesse dinheiro para tal).

Além disso, a dívida que tinha por causa dos gastos iniciais, vai se acumulando com estadia e alimentação transformando-se em algo praticamente impagável. O verdadeiro motivo de sua contratação é revelado e a condição de escrava sexual vira algo praticamente irreversível.

Sem documentos e forçada a ficar na clandestinidade, a mulher ainda sofre com a vergonha de ter sido enganada e eventualmente com ameaças de que represálias possam ser tomadas contra seus familiares no seu local de origem em caso de alguma denúncia ser feita. Isso geralmente é mais do que suficiente para que se cale e aceite a situação.

6) Jornada de trabalho supera 10 horas diárias

As condições de moradia oferecidas costumam ser precárias e a jornada de trabalho pode chegar a 12 horas por dia, sendo vedado às mulheres recusar qualquer cliente. Inclusive elas são incentivadas a consumir drogas e álcool se isso for requerido pelos contratantes, o que leva muitas a uma condição irreversível de vício.