Bom pessoal, hoje vou falar sobre um assunto bem polêmico que afeta toda cidade grande: moradores de rua. Sair em Porto Alegre é uma missão quase dramática, afinal para qualquer lado que se olhe há um morador de rua. Um homem, na maioria das vezes. Jovens, idosos. Mães e seu filhos pequenos, muitas vezes criança de colo. Pedindo, vendendo balas... um verdadeiro tormento que cresce a medida que se aproxima o centro de Porto Alegre.
Entre uma esquina e outra, embaixo de árvores ou marquises dos prédios. Embaixo de pontes ou viadutos. Onde houver um espaço que possa proteger do frio o inverno implacável ou do calor escaldante do verão que não perdoa. É uma imagem que choca, que apavora. E que levanta muitas questões. Porque estão alí, vivendo nas ruas? O que aconteceu com essa pessoa? Como é a vida dessas pessoas? Afinal, são seres humanos com direito a uma vida, um trabalho, uma casa e um prato de comida.
São Seres humanos vivendo pior que animais.
Porto Alegre tem mais de 1.347 moradores de rua, cerca de metade deles nascidos na capital gaúcha. Os homens são grande maioria – 82%, e cerca de 60% do total desempenha atividades como catar material reciclável, realizar atividades de reciclagem, guardar e lavar carros na rua. Os dados são de uma pesquisa realizada pela Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), órgão ligado à prefeitura.
Pouco mais de um terço – 27,3% – vive no Centro. E quase todos estão expostos à violência, como a que matou um papeleiro em Caxias do Sul, na Serra gaúcha.
Um adolescente de 14 anos, saiu de casa após brigar com a família. Desde então, ele carrega consigo apenas um cobertor para se proteger do frio. Hoje mora sob de uma das pontes do Arroio Dilúvio, na Avenida Ipiranga, na Região Central. "Eu não queria fazer o serviço, e eles me obrigaram. Aí pulei a cerca e saí correndo", conta o menino.
Em frente ao Foro Central, vive Seu Carlos, de 65, anos que sobrevive nas ruas de Porto Alegre há 25 anos. A única companhia que tem é dos gatos de estimação. O próprio morador tem dificuldades para explicar o motivo da situação que passa, e afirma que evita entrar em contato com a família. "Minha família hoje é aqui", diz.
Sob da sombra de uma enorme paineira na Rua Vicente da Fontoura vive Paulo, um homem com o olhar triste e que transparece um passado conturbado, mas cheio de saudades. Tudo o que ele tem foi doado por moradores. Na sala improvisada em frente à barraca onde dorme, ele passa a maior parte do tempo escutando rádio e lendo jornais e livros. "Trabalhei em outras coisas, mas não me adaptava. Voltava para isso de novo", declarou.
Espaço vazio... um novo lar
Há pelos menos dez meses, uma moradora da Rua Oscar Bitencourt, no Menino Deus, viu a frente de sua casa ganhar outra casa. Por ali, um homem apoiou uma lona entre duas árvores, acomodou seus pertences e tomou o espaço como casa. A "vizinha" que acompanhou de camarote a mudança se apieda da condição do homem e também da sua por ter a calçada ocupada por um problema social pelo qual os moradores do bairro tropeçam diariamente há anos e que desponta sob uma nova organização: as pessoas em situação de rua não só circulam pelo bairro como transformam os espaços públicos em endereço.
O caso da Oscar Bitencourt se repete sob o Viaduto Telmo Thompson Flores, no cruzamento da Avenida Praia de Belsa com a Rua José de Alencar. Bruno Kuppes, 30 anos, de Santana do Livramento, e Silvana Maria de Oliveira, 42 anos, de Alvorada, estão há meses sob a estrutura de concreto, onde sobrevivem a custa de doações e dos pouco mais de R$ 70 que Kuppes recebe do Bolsa Família. Não têm perspectivas de sair dali. Adotaram cães, todos esterilizados por protetores de animais, ganham roupas e comida e até já se acostumaram com a barulheira infernal do trânsito.
— A gente vai ficando, até conseguir uma casinha, né? — revela Silvana, quase em tom de oração.
A Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) sabe que a região é uma das mais problemáticas quanto à questão da população de rua e, por isso, reforçou as equipes de abordagem nesta área mais central da cidade. A proximidade com a orla e com o Centro Histórico, além da presença de áreas comerciais efervescentes são atrativos para quem luta para sobreviver. Essa realidade também é reforçada pela presença de abrigos na região e pelo próprio acolhimento dos moradores.
— A lógica de quem vive na rua é ficar onde há circulação de pessoas e poder aquisitivo. Na região do Menino Deus, outra característica é a doação de alimentos pelos próprios moradores. A gente vê nas ruas, as pessoas fazem os "macaquinhos", deixam comida em sacolinhas penduradas em árvores ou grades — diz a diretora técnica da Fasc, Marta Borba.
Fasc terá de ampliar abrigos
Em 2012, a fundação divulgou os dados de uma pesquisa realizada em dezembro de 2011 sobre a população em situação de rua na cidade. Constatou-se a presença de 1.347 pessoas nas ruas, 144 a mais do que o observado em um estudo feito em 2007 pela UFRGS. O pequeno crescimento revela uma certa estabilidade no tamanho desta população, mas alguns dados, como a presença de famílias inteiras vivendo na rua motivaram o Ministério Público Estadual (MPE) a ingressar, em 2007, com uma ação exigindo a ampliação da rede de assistência a essas pessoas. Em dezembro, a Justiça determinou que fossem criados novos abrigos na Capital.
— O poder público não criou vagas para acolher essas pessoas. O que vinha ocorrendo era só uma reordenação das vagas existentes. Essa sentenção é uma resposta a essa população que sempre ficou marginalizada — avaliou a promotora Liliane Dreyer da Silva Pastorizi, que substituiu, na promotoria de Defesa dos Direitor Humanos de Porto Alegre, Angela Salton Rotuno, que ajuizou a ação sete anos atrás.
A Fasc garante que a ampliação determinada pelo Justiça já estava prevista no Plano Municipal de Enfrentamento à Situação de Rua e que, neste ano, serão criadas duas repúblicas, com 10 vagas cada, um abrigo com capacidade para 60 pessoas e duas casas-lares para idosos, com 10 vagas cada uma.
Nenhum comentário:
Postar um comentário