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Caso Escola Base

Era, aparentemente, mais um mês inicial do ano de 1994. Março, bairro da Aclimação, em São Paulo. A partir dali, as vidas de seis pessoas estariam irreparavelmente destruídas. Todas elas foram acusadas de abuso sexual contra crianças dentro da Escola de Educação Infantil Base.


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Após perceberem um comportamento estranho nos seus filhos, os quais eram alunos da instituição, Lúcia Eiko Tanoue e Cléa Parente de Carvalho se dirigiram à 6ª Delegacia de Polícia, na Zona Sul de São Paulo, e prestaram queixa contra três casais que trabalhavam no colégio.


Segundo as mães, o casal Maria Aparecida e Ayres, os donos da escola, promovia orgias sexuais com as crianças na casa de Saulo e Mara, pais de um dos alunos. Além deles, Paula e Maurício Alvarenga – a sócia de Aparecida e o motorista da Kombi a qual levava as crianças para casa, respectivamente – também estavam supostamente envolvidos. O delegado responsável pelo caso foi Edélson Lemos, que encaminhou as crianças ao Instituto Médico Legal (IML) e conseguiu um mandato de busca e apreensão no apartamento de Saulo e Mara.


[caption id="attachment_2675" align="aligncenter" width="480"]Delegado Responsável Delegado Responsável[/caption]

Contudo, nada foi encontrado na residência do casal durante a busca da polícia. Devido à falta de provas, o delegado retornou à delegacia, o que gerou indignação nas mães e elas acionaram a Rede Globo. No final do dia, o IML enviou um telex com a seguinte mensagem:



"Referente ao laudo nº 6.254/94 do menor F.J.T. Chang, BO 1827/94, informamos que o resultado do exame é compatível para a prática de atos libidinosos". Dra. Eliete Pacheco, setor de sexologia, IML, sede.



Isso foi o suficiente para que Lemos advogasse a culpa dos acusados e iniciasse uma série de declarações equivocadas à mídia. Pelo fato de diversos veículos midiáticos estarem mostrando a figura das crianças e seus pais como vítimas, a opinião pública já tinha Aparecida, Ayres, Paula, Maurício, Saulo e Mara como os verdadeiros vilões do ocorrido.


Já não havia mais retorno, a história dos seis pedófilos que abusavam sexualmente de criancinhas em pleno horário de aula já tinha um veredicto popular.


Com o passar dos dias, a sede dos veículos comunicativos, sedentos por notícias, instigavam o delegado a dar cada vez mais informações parciais e não comprovadas. Satisfeito com o assédio dos repórteres, ele dava declarações sem confirmação exata. O feriado da páscoa estava se aproximando e, com isso, as notícias frias eram comuns nas redações. Nada de grande impacto estava acontecendo, então foram raros os jornais que não trouxeram a Escola Base como manchete.


O Jornal Nacional chegou até mesmo a sugerir o consumo de drogas e a contaminação pelo vírus da Aids, enquanto a Folha da Tarde noticiava: “Perua carregava crianças para orgia”; o tabloide Notícias Populares, por sua vez, estampou a capa com o título: “Kombi era motel na escolinha do sexo”.


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Quando as primeiras provas de que os seis funcionários da escola eram inocentes começaram a surgir, o delegado foi afastado do caso e assumiram o seu lugar Jorge Carrasco e Gérson de Carvalho. Após esse fato, uma denúncia anônima levou a polícia à casa de Richard Harrod Pedicini, que foi preso pela suspeita de tráfico das fotos de crianças, entre elas as da Escola Base. Entretanto, isso não foi realmente comprovado.


Os menores foram levados à casa de Richard para que pudesse haver o reconhecimento do local. A menina, filha de Cléa, viu uma abelhinha de pelúcia no chão e quis brincar com ela, o que foi suficiente para alegarem que a garotinha estava identificando a residência.


Diante disso, mídia logo tratou de dar a sentença: “Alunos da Escola Base reconhecem a casa do americano”, e “Criança liga americano a abuso de escola” foram manchetes do Estadão e da Folha, respectivamente. No dia 13 de abril, dois dias após a prisão do americano e depois de tanta repercussão, foi esclarecido de que ele não tinha ligação com o caso Escola Base. Ele e os supostos culpados nem mesmo se conheciam.


Após a prisão preventiva de Saulo e Mara, os advogados tiveram acesso ao telex do Instituto Médico Legal (IML) e viram que o seu resultado era totalmente inconclusivo. O documento alegava que as cicatrizes no menino poderiam ser tanto de um abuso sexual como também de uma diarreia forte. Mais tarde, a própria Lúcia Eiko confirmou que seu filho sofria de constipação intestinal.


Nesse contexto, a situação dos indiciados começou a ser revertida. Provas da inocência dos seis, como depoimentos de funcionários do colégio e dos pais de outros alunos, passaram a surgir na defesa deles.


Todavia, apenas no dia 22 de junho os suspeitos de abuso sexual de menores foram inocentados pelo delegado Gérson de Carvalho. Discretamente, os jornais começaram suas retratações e focaram no ponto de vista das atuais vítimas, antes culpados. Porém, nada foi suficiente para consertar tantos danos morais e a exposição gerada aos três casais envolvidos.


Principais Envolvidos


Os principais envolvidos no episódio foram os proprietários da escola, o casal Maria Aparecida Shimada e Icushiro Shimada (Ayres); seus sócios, Paula Milhin de Monteiro Alvarenga e Maurício de Monteiro Alvarenga; e os pais de um dos alunos, Mara Cristina e Saulo Nunes. Ambos foram os acusados de abuso sexual contra as crianças da Escola Base e julgados precocemente pela imprensa e polícia.


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No entanto, o delegado Edélson Lemos também figurou entre os nomes de destaque no caso. Foi ele quem interpretou o telex do IML de maneira parcial.


Ainda dentro da polícia, pode-se citar o nome do juiz Galvão Bruno e dos delegados Gérson de Carvalho e Jorge Carrasco. Estes assumiram as investigações após o afastamento de Lemos.


Contudo, é impossível falar no caso Escola Base sem lembrar os nomes daquelas que deram início a todo o desenrolar da história: Lúcia Eiko e Cléia Carvalho. Já Richard Harrod Pedicini, americano residente no bairro da Aclimação, foi acusado de ser o responsável pelo tráfico das fotos dos menores da Escola Base e também de outras crianças.


Uma vez condenados pela mídia e, consequentemente, pela maioria da sociedade, as reais vítimas do caso Escola Base jamais recuperaram a honra e nem a paz. Mesmo após o encerramento do caso, os veículos de comunicação não se retrataram da forma correta. Muitos divulgaram que as investigações cessaram por falta de provas; no entanto, entre faltar provas e a confirmação da inocência dos seis há uma enorme distância.


Ayres Shimada está com muitas dívidas financeiras. Além disso, sofre com problemas emocionais e não consegue dormir à noite. Sua esposa, Maria Aparecida Shimada, viu seu projeto (a Escola Base) terminar devido às acusações.


Saulo e Mara Nunes chegaram a ser presos durante o clímax do caso, mas foram soltos depois da corroboração de sua inocência. Entretanto, enfrentam problemas financeiros por causa da dívida acumulada durante a contratação de advogados.


Já o casal Paula e Maurício Alvarenga se divorciou. Ele ficou transtornado psicologicamente, sofria de síndrome do pânico, tinha medo de sair à rua e, para encontrar seu advogado, montava esquemas de disfarce devido ao medo de alguém o reconhecer. Já Paula, após a separação, foi morar com suas duas filhas na casa da mãe e não possui emprego fixo, pois está impedida de lecionar. Seu rosto estava marcado e ninguém jamais confiou novamente em uma suspeita de abuso sexual infantil.


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Edélson Lemos, delegado responsável pela maior parte das investigações, tornou-se delegado titular e dá aulas na academia de Polícia Civil.


Richard Pedicini, o “gringo” da história, se viu livre das acusações ao ser desmentido o seu suposto envolvimento no caso Escola Base. Após o episódio, dedicou-se a provar, cada vez mais, a sua inocência. Dessa forma, também aglomerou inúmeros débitos financeiros.


As mães Cléa e Lúcia, aconselhadas pela psicóloga Walquiria Fonseca Duarte, continuaram com o tratamento psicológico dos seus filhos, pois, de acordo com a especialista, eles foram realmente vítimas de abuso sexual.


As vítimas da acusação moveram uma ação contra o Estado e alguns veículos de comunicação, como a Veja, Folha de São Paulo e a Globo. A esposa de Ayres faleceu em 2007 por causa de um câncer; Maurício e Ayres receberam ressarcimentos de algumas empresas, no entanto ainda aguardam a indenização do Estado. Embora tenham sido ressarcidos, eles continuam com problemas financeiros e abalados psicologicamente, visto que a suas vidas foram completamente arrasadas pela polícia, imprensa e sociedade.


Paula foi a única que não recebeu nada e está correndo risco de que seu processo prescreva. Atualmente, ela mora em sua casa depredada, tem problemas de saúde, emocionais e financeiros. Ela nunca conseguiu outro emprego.


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Acompanhe essa reportagem sobre o caso Escola Base e esse gravíssimo erro do jornalismo Brasileiro.


http://www.youtube.com/watch?v=ba7WOYfPbm0

O caso foi tão grave que as consequências não foram poucas. Veja como estão os acusados, 20 anos depois. Clique AQUI e veja o documentário completo.  Icushiro Shimada faleceu dia 16 de abril de 2014.


Fonte: Casa dos Focas (texto de Alice Andrade)

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